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  • Foto do escritorFilipe Lutalo

Quarto de despelo: Diário de uma favelada


JESUS, Carolina Maria de. Quarto de Despejo: diário de uma favelada / Carolina Maria de Jesus; ilustração Vinícius Rossignol Felipe. 10. ed. São Paulo: Ática, 2014. 200 p.


Em sua 10ª edição e 8ª impressão, o livro da autora Carolina Maria de Jesus, lançado pela editora Ática em 2014, possui ilustrações de Vinícius Rossignol Felipe, impresso em papel pólen bold 90 g/m², com ilustrações em duas cores.


Carolina, autora e protagonista, narra de forma crua a sua vida e o cotidiano da favela do Canindé nos anos de 1955 a 1960. Ela retrata a sua luta diária por comida para alimentar a ela e a três filhos. Mulher negra e solteira, uma sobrevivente da miséria, na coleta de materiais reciclados, ossos no mercado, legumes descartados e no registro fiel do seu dia a dia, ela encontra força para continuar viva.


Carolina abre o seu relato mencionando o custo de vida em 1955. “Aniversário de minha filha Vera Eunice. Eu pretendia comprar um par de um sapatos para ela. Mas o custo dos gêneros alimentícios nos impede a realização de nossos desejos.” Essas frases simples revelam muito o que os brasileiros viveram e vivem no seu cotidiano. A prioridade do homem e da mulher sofrida que se encontra na miséria é adquirir comida para matar a fome. Sapatos, roupas, casa aconchegante, são confortos que o dinheiro não pode comprar.


A protagonista dessa história encontra a atenuação de sua penúria no trabalho duro e causticante. Chova ou faça sol, Carolina sobrevive da coleta de papeis, ferro e doações.


Carolina demonstra ser uma mulher deslocada da vida da favela. Alfabetizada, lê e escreve. Nas páginas do Quarto de Despejo, relata a preocupação para que os filhos frequentem à escola, talvez uma via para que um dia eles deixem a miséria para trás. Ciente dos jogos políticos de São Paulo que usam as favelas e a fome como plataforma eleitoral, Carolina não se deixa enganar, ela distingue o discurso eleitoreiro que apenas leva o favelado a sonhar com dias melhores.

A dureza de suas palavras é tão gelada quanto a facada que a fome defere naqueles que não sabem o que comerão amanhã. Ela, a fome, é uma personagem constante na vida da família de Carolina, chega a incomodar. Por vezes, o lirismo é um alívio ao realismo e nos leva a rir de jogos de palavras extremamente inteligente e geniais.


Infelizmente, em 2021, as palavras publicadas por Carolina Maria de Jesus em 1959 ecoam nas latas vazias de 27 milhões de brasileiros. Sessenta e dois anos da publicação do livro, nos deparamos com pessoas frequentando a fila dos açougues para conseguir um pedaço de osso para adensar a sopa. A leitura do relato de Carolina Maria de Jesus e a constatação que a fome é uma realidade tão pujante ainda hoje, demonstra nossa incompetência em vencê-la.


Quarto de despejo também relata o preconceito racial e social vivido pelas pessoas negras. A relação entre os imigrantes espanhóis, portugueses e brasileiros nordestinos que buscam na São Paulo do final da década de 1950, melhores perspectivas de remuneração. Carolina, em passagens do livro, registra a presença dos operários das fábricas.


O romance, Quarto de Despejo: diário de uma favela, é uma literatura obrigatória e formadora. Os conflitos sociais que aparecem no livro nos leva a refletir que precisamos investir de forma séria no combate a pobreza e a fome. Nessa guerra, toda a sociedade precisa tomar consciência que a fome constitui um dos mais pérfidos instrumentos de tortura, pois ela aniquila o ser humano lentamente e sem clemencia. Precisamos desenvolver de forma séria, políticas de segurança alimentar e não utilizar a fome, apenas, como plataforma eleitoreira.

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